17/08/2010

Ausência (Vinícius de Morais)




Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar seus olhos que são doces...

Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres exausto...

No entanto a tua presença é qualquer coisa, como a luz e a vida...

E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto...

E em minha voz, a tua voz...

Não te quero ter, pois em meu ser tudo estaria terminado...

Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados...

Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada...

Que ficou em minha carne como uma nódoa do passado...

Eu deixarei...Tu irás e encostarás tua face em outra face...

Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada...

Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu...

porque eu fui o grande íntimo da noite...

Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa...

Porque os meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço

E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.

E eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos

Mas eu te possuirei mais que ninguém, porque poderei partir.

E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas,

serão a tua voz presente, tua voz ausente, a tua voz serenizada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário